sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

Permanece

Amigos partindo me aproximam de quem fica. Este tipo de partida faz-me pensar acerca de quem permanece. Caso questionada sobre uma memória estupenda, asseguro: a coexistência.


O convívio de antes é dádiva vigente – gratidão que corre nas veias desta saudosista, quiçá inconformada com o sumiço físico; sempre pensando "podia ter aproveitado mais".

Este amor assíduo, então, no meio da falta e do arrependimento (quando as lembranças dedicam a nostalgia o seu carinho) desperta sons, cheiros gestos e mais... como marca de quem foi nos que ficam com o que tem: esse memorial de empatia – conserva do tempo e dos ativos tomados de afeto.

E quando a saudade lacrimeja no berço do privilégio, repouso dos laços fraternos e agora eternos, meu canal lacrimal se esvai em poesia declamando a presença na ausência.





À Tereza

domingo, 26 de outubro de 2025

Carta a um jovem mancebo de quase 27 anos atrás.

Dia desses pensei em nós como evito pensar. Culpa do rádio que tocou algo nosso quando freei e por sorte o sinal fechou. Sintonizei afetos pretéritos com a música e desliguei quando percebi.


Cheguei em casa e sai te procurando online até lembrar que seu corte seco me inspirou a cortá-lo como me cortou. Bloqueado estava e não o desbloqueei.

Mantive apenas a memória dos arrepios no carro evocados pelo som.

Passada a sensação eu te escrevo. Sem outra pretensão além de reconhecê-lo como o mais próximo de um amor profundo e fecundo. Éramos jovens, tínhamos ideais e sonhos compatíveis com a penumbra da adolescência.

Você foi: uma condensação de afetos, um meio de fruição, o fluído da imaculada esperança; e tornou-se uma despedida silenciosa, esnobou minha versão sem ouvir-me e privou-me de um terno abraço – o derradeiro adeus.

Estamos longe, mas estou certa: perdeu uma ótima oportunidade de escutar a minha história e eu perdi uma excelente chance de – na época – focar em mim.

Já não ouço mais nada a seu respeito e inclusive não procuro saber. Sei desta que vos fala e te diz: fique bem, saudável, confortável e seguro – assim como estou no contexto atual.


♥️


Obs.: se você leu esta carta ela é destinada a um querido que não vejo a aproximadamente quinze anos. O cálculo do título é baseado na idade em que nos conhecemos; a gente estudava em salas diferentes, mas na mesma escola. Talvez este texto nunca chegue a quem o inspirou e está tudo bem – chegou em você. Vamos juntos!

domingo, 21 de setembro de 2025

Um textinho sobre livros e leituras, será?

Gosto muito de ler, não sou uma compulsiva literária muito menos uma leitora patológica... Apenas leio.


Leio nas horas de conforto e nas de desconforto, seja para me encontrar ou perder-me de mim;

Leio pela companhia das palavras mais macias e pela cortante ausência delas.

A verdade é que ler, no meu caso, preenche algumas lacunas e abre vazios – os quais levo a terapia.

Um livro não passa pela minha vida sem imprimir suas marcas alinhadas a esta que vos fala quando escreve.

Por pior – ao meu ver – que seja um livro ele comunica alguma coisa mesmo quando indigesto, difícil ou prolixo.

Insisto com alguns, corro com outros, contudo, com os melhores tenho curtas ressacas e uma boa sobriedade.

Já me perdi, admito, desconheço se falo de fato sobre livros ou sobre amigos.

Coleciono pouca gente, pois como na aquisição de uma obra literária a qualidade vem antes do montante.

Logo me enganei com muitas capas e aprendi a passar do índice sem esnobar o prefácio, isto é, pra compreender mais.

Diferente de muitos minha vida não é um livro todo aberto – sou a favor do spoiler, mas gosto da surpresa.

Dou abertura para novas amizades fazerem seus lançamentos e as velhas suas releituras – ambas com edições.

Também me re/edito. Quem nunca?

Enquanto isto me componho com o folhear da vida: onde minhas páginas avançam consultando as de trás.

Um alívio: sou capa dura e escrevo a mão minha história sem atalhá-la.

Apesar da rigidez externa sou brochura por dentro o que me faz ser estrita em partes, mas fácil e acessível no resto.

Também sou livro e o que disse me contempla: é impossível agradar a todos e isto faz parte da gente.








domingo, 14 de setembro de 2025

Avessa a algumas (im)posições

Aprendi como o silêncio quando tático é dadivoso. Ele me escudeia ou me inspira a ação. Por vezes, emudecida escuto as pessoas sem qualquer conhecimento acerca de algo entabular um assunto conservando-me calada e em paz. O silêncio quando estratégico organiza a ideia antes de compartilhá-la.


Eu por ser falha como tantos outros, ao posicionar-me sobre um tema por mais aleatório que pareça pondero se ele é equilibrado pela premissa básica de que consigo escutar além dos ruídos aparentes em meio a colocações sejam passivas (agressivas ou até assertivas) a minha própria coerência e incoerência que me deixa ensimesmada?!

Ao manusear as palavras enfileirando cada uma delas numa frase sempre me pergunto: compensa a exposição? E dessa forma mantenho muitas delas engavetadas para usá-las, adaptá-las ou descartá-las se preciso for, pois no final das contas quem escreve e fala se entrega e nem sempre vale a pena doar-se se ninguém prestar atenção.

Logo, sou pela comunicação genuína e  empática –  não a forçosa, que é especulativa e/ou falsa; sim, eu sou avessa a algumas imposições e a outras posições questionáveis.







segunda-feira, 14 de julho de 2025

Carta póstuma – nunca é tarde para se despedir

 Oiê,

Não estranhe, mas hoje em dia a maioria se cumprimenta assim. Vim falar que quando se foi não tive a oportunidade de me despedir.
Saiba, então, que sinto muito... muito mesmo.
Do senhor herdei o sorriso torto – a inteligência deixei para outros sobrinhos – e o gosto pela leitura que compartilho contigo e esses inteligentes, risos.
Até me assustei quando achei seu livro preferido por um acaso e descobri ser o mesmo meu.
Após uma longa temporada da sua formatura fui a próxima da geração da Mainha a me graduar...
Fiz comunicação na época. Meu irmão e alguns primos se formaram na sequência. E eu depois de alguns anos cursei psicologia.
Não tenho sua genialidade (pois é assim que é lembrado), contudo de acordo com tia Cleusa amo feijão igual o senhor e ela me disse isto faz anos.
Às vezes, me pego pensando nas ideias que a gente ia trocar se sua presença não fosse só memórias. Será que seria progressista ou conservador?
Eu não sei... O mundo está um caos, a esperança é um exercício constante para a humanidade e eu definitivamente sou uma pessoa esperançosa.
Te escrevo, porque quero dizer que segue sendo lembrado. Mamãe, por exemplo, sente sua falta, ela fala de uma afinidade única entre vocês.
Digo a ela que como há melhores amigos vocês foram melhores irmãos e para ela você é insubstituível, como os outros dez também.
Apelidei-a de "bairrista", risos, porque ela é pela família sempre.
E por isto ela é um muro de proteção, uma ponte que une e um abrigo seguro para muitos de nós.
Painho partiu, mas Mainha segue lindona conosco. Teria orgulho dela. Ela é generosa, lúcida e sábia.
Não constituí uma "família" – mas tenho um amor colossal pela estreia do sol aceso na pressa dos dias. A impermanência não só brilha, ela ilumina.
A vida é uma espiral afetiva e a morte um tilintar (palavra que aprendi em "nosso" livro) que não para em quem fica. Como a sua em mim: ela ressoa!


Enfim, saudades...

Marcinha






domingo, 27 de outubro de 2024

Precisamos falar sobre Forest

Foi Jenny que instruiu Forest a correr pela primeira vez, e foi ela quem o orientou a não bancar o herói na guerra e correr. Ela o incluiu ainda criança quando todos o excluíram. E também o evitou e até fugiu dele algumas vezes. Jenny foi o amor de Forest Gump e este texto que parece sobre ela, todavia, fala dele e suas relações.

Sempre que assisto "Forest Gump – o contador de histórias" me emociono. É como se eu tivesse novos insights, a cada reprise.  Observei, dessa última vez, as relações dele: ele com a mãe,  ele com Jenny quem já introduzi acima, ele com Bubba, com o tenente Dan (que bate de frente com as garotas de programa e defende ele com as palavras da sra. Gump: "ele não é estúpido")e até consigo.

Mesmo com sua limitação cognitiva, vale explorar as múltiplas formas de inteligência que ele tem (vou sugerir que pesquisem sobre Howard Gardner e a forma como ele destrincha sobre inteligências) Forest não se rendeu ao capacitismo.

Muito disso pelo modo como sua mãe o educou, enquanto o diretor afirmava que ele era diferente e os colegas o humilhavam, sua mãe o ensinava (e estimulava) que não aceitasse que as pessoas dissessem que ele era estúpido  e assim ela com empatia o incluia, o aceitava e o confirmava, mesmo quando a maioria o rejeitava, o ensinado a se amar.

Ele vai a faculdade e se destaca no futebol americano; no exército também se destaca (seja na guerra ou no pingue pong). Ele honrando a memória e comprisso firmado com Bubba, enriquece. Sua riqueza então o oportuniza a ajudar e assim o faz. Ele segue amando Jenny,  vira jardineiro, sai para uma corrida e mais uma vez vira notícia...

Isto tudo sem falar que ele narra a jornada dele como ninguém. É como se cada evento que ele viveu tomasse quem o escuta de curiosidade pelo desfecho da sua história acachapante.

A certa altura ele se realizou no campo amoroso, tem outra perda irreparável e assume – no final – talvez o seu mais importante papel. Forest foi muito discriminado, porém encontrou em seus vínculos mais fecundos acolhimento. E mesmo consciente de sua deficiência intelectual – com o estímulo que recebeu – teceu uma história de cuidado, amor, luta e superação frente a todo preconceito.

Quando assisti Forest Gump recentemente, filme que me inspira,  enxerguei um misto de sentimentos que me levam a pensar em como eu tenho construído minha história. Pois no fundo a lição que fica para mim fala muito da rede de apoio que ele teve, e também da visão de mundo que ele construiu e nutriu: modesta, generosa e potente sem igual.


💓


Dedico este texto a um elemento essencial da minha rede de afetos, meu querido Antônio. 

terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

QUARENTA 🌹

 Oi,


Eu não poderia deixar este dia tão simbólico passar despercebido...

Aliás,  são 4 décadas de vida, que mescla um lado autêntico e um mais artificial.

O primeiro (focarei nele) é o que guia  meu propósito, meu esforço e minha voz.

Com ele custei a descortinar os tecidos que forravam meus olhos de certezas.

Foi quando entendi que mais do que posses é preciso autonomia, senso de pertencimento e qualidade.

Mudei, então, o olhar... Projetei minha intimidade para fora ao distribuir – de forma intuitiva – os papéis que performo.

Todos os que meu corpo abriga, orienta, cuida e compartilha;

Todos folheados a medida que saboreio mais uma página dessa nova leitura.

Afinal, faz tanto sentido aceitar minha ousadia como freio para covardia.

Isto transporta a autoestima para espaços vazios sem complexos cheios.

E é aí que ocupo uma vaga na garagem da coragem, onde estaciono medos sem abastecê-los.

É, hoje faço 40 e me celebro como uma ode a vida, como um louvor ao dia presente e as minhas versões mais salutares, emocionadas e simples.